Para mim, o tempo passa bem devagar, porém hoje corre como um vento frio de inverno. Fumo um cigarro e observo pessoas indo e vindo, um mar morto de expressões em suas faces. A cada tragada, sinto meu pulmão pulsar, numa força tão brusca que me faz tossir. O que eu faço ali sentada àquela calçada? Esperando alguém para me abraçar, me levar para casa e aceitar meus erros? Não. Naquela tarde, era apenas eu.
O jeito que o vento sopra meus cabelos, o arrepio resultante do meu sangue fervendo. Isso me lembra você. Observo minhas pernas e as percebo trêmulas, até penso ser um sinal para avisar que você se aproxima. Só imaginação, alarme falso. Me levanto e ando umas duas quadras até notar o que eu faço ali.
A rua virou meu refúgio hoje, me segurou nos braços e não me largou até que eu quisesse, afagou meus cabelos até que eu arejasse a mente, me tomou de conta até que eu pedisse. Sinto algo frio me escorrendo o rosto. Lágrimas. Será meu coração tão gélido quanto uma lágrima? Não fui capaz de amar. E o meu rosto se torna agora só mais um no meio da multidão de rostos, cada um com sua história.
Volto para casa e me sento à beira da cama, acendo mais um cigarro. O ardor, o prazer de tragá-lo é incomparável.
Deveria cuidar disso, penso. Não do vício, mas dessa primavera emoções dentro de mim, florescendo várias delas ao mesmo tempo. Se a indecisão causa tudo isso, imagine o amor. O cheiro de nicotina se mistura ao aroma do perfume masculino fortíssimo que estou usando e isso me faz apagar o cigarro. Me pego pensando no porquê de ter fugido de tantas emoções a alguns dias atrás. E agora, todas de uma vez, elas me apunhalam pelas costas.
Depois de rir um bocado, paro e fico ainda mais pensativa. Eu sei, costume estranho. Lembro daquela noite turbulenta e de como tudo isso começou sem razão. Fecho os olhos e o que mais me vem a cabeça são as insanidades que fizemos para ao menos poder olhar nos olhos um do outro e sentir a pele com o toque das mãos. Engraçado como em um milhão de anos nunca passou em minha mente o fato de viver algo tão inesperado.
Lembro de ter escrito uma vez, numa dessas noites de insônia, um fragmento de um texto que dizia: "
A vida é feita de histórias e essa é uma pequena parte dela. Caminhos se cruzam para enriquecerem suas paisagens e depois seguem, mais ricos em belezas, sozinhos ou vivendo em si as partes deixadas pelo outro. Meu caminho se cruzou com o teu para aprendermos um com o outro, estava escrito. Talvez um dia eu já não olhe mais em teus olhos da mesma forma...". E esse dia chegou. Agora eu sei que da vida eu não compreendo nada. Abro os olhos e vejo que passei um bom tempo pensando em tudo. Tentando entender você. Tento organizar meus pensamentos.
Ordem a partir do caos. É possível?
A.